CONHECE-TE A TI MESMO
Meu marido tinha sido casado
pela igreja à qual ambos pertencíamos quando jovens. Quando nos casamos, ele tinha dois filhos,
com dez e doze anos de idade. Naquela
época, nós dois éramos agnósticos nas nossas crenças. Meu marido achava que uma separação completa
era a melhor maneira de enfrentar o problema das crianças. Seguimos isso de forma mais ou menos
rigorosa, e o alcoolismo foi nosso único problema grave durante quinze
anos. Apesar de ser uma enfermeira
diplomada, eu não sabia o quanto é grave o problema do alcoolismo.
À medida que a doença corria
o seu conhecido curso descendente, fiz todas as coisas tipicamente
erradas. Juntos, fizemos praticamente de
tudo para resolver o problema, com grandes custos, tanto financeiros como emocionais,
para nós dois. De certa forma, acho que
muitas das tentativas frustradas dos médicos de curar o meu marido foram úteis,
porque somente depois de tantos fracassos ele conseguiu pedir ajuda ao AA. Estou certa de que para ele foi um último
refúgio. Era AA ou nada mais. Este foi o seu próprio ultimato.
Meu marido e eu desfrutamos
de uma vida agradável, sóbria e cheia de energia durante muitos meses. Ele falava em muitas reuniões e falava
bem. Nunca perdeu o seu exigente emprego,
embora tivesse cometido, muitas vezes, erros que saíram caros, mas que foram
cobertos.
Eu comecei a participar
ativamente do Al-Anon e achava que era a melhor coisa do mundo. Para um trabalho do Al-Anon que eu estava
fazendo, era necessário estudar os Doze Passos em detalhe. Eu me considerava uma autoridade, antes mesmo
de saber do que se tratava o programa!
Entretanto, descobri que o estudo que fiz foi muito gratificante, quando
precisei muito dele para mim mesma, e o recomendo especialmente a todo aquele
que se sinta tão presunçoso quanto eu.
No final de alguns meses de
sobriedade, meu marido recebeu a notícia de que seu filho mais velho estava
seriamente doente, num local mais ou menos distante. Então começou uma série de visitas semanais
ao hospital, acompanhado da sua ex-esposa.
Eu era excluída dessas visitas, no meu próprio interesse e no jovem,
conforme me explicaram. Sinto admitir
que eu não acreditava muito nisso, principalmente quando meu marido voltava
toda vez – para o jeito dele – muito falante e entusiasmado, depois de visitar um filho doente, que
nem sequer respondia!
Quando falei com ele sobre
isso, ele me disse que eu estava imaginando coisas. Não pude evitar pensar que agora, na
sobriedade, ele estava de novo atraído por ela.
Ela é uma mulher de carreira que tem sucesso e não tornou a se
casar. Insisti em ir com eles a essas
visitas, simplesmente porque não podia agüentar meus pensamentos enquanto ele
estava fora. Isso, naturalmente, só agravou
a situação para mim. Ninguém parecia se
importar comigo. Eu era simplesmente
ignorada.
Estava espantada e revoltada
por ter-me deixado envolver dessa forma, mas eu racionalizava e, como sempre,
caía na autopiedade. Quando se tornou
bem claro que eu não podia mais controlar meus sentimentos, eu quando me
disseram que essas visitas continuariam, independente de como me sentisse,
fiquei totalmente desesperada.
Seguiram-se três meses de
angustiante tortura e de lacrimosas tentativas de compreender e resolver esta
situação, que para mim era impossível.
Tentei pedir conselhos a companheiros do Al-Anon, do modo mais discreto
e honesto que me era possível na ocasião.
Tentei, sem resultado, aplicar os Doze Passos. Tentei a Oração da Serenidade e rezei, mas só
para me libertar.
Todas estas medidas ajudaram
temporariamente, mas em última análise, eu não tinha mudado em nada, porque
estava firmemente convencida de que os outros estavam errados. Tentei ser justa, mas não pude. Pedi sabedoria para saber se isto era algo
que eu pudesse modificar, mas não descobri.
Não naquele momento.
Então, me sentindo ainda
totalmente rejeitada e paralisada, e tendo dito a meu marido que eu achava que
devíamos nos separar, fomos juntos à reunião de aniversário do meu Grupo
Al-Anon. Nessa noite tivemos um orador
maravilhoso, de grande espiritualidade. Ele nos levou através de onze dos
Passos, mas eu perdi o que ele disse a respeito da maioria deles. No entanto, meus ouvidos se aguçaram quando
eu ouvi dizer que o despertar espiritual
ao qual se refere o Passo Doze não precisa vir como uma pancada na cabeça, que
tudo o que realmente precisamos para nos iluminar é conhecermos profundamente a
nós mesmos. De alguma forma, isso pareceu ter uma grande importância para mim,
mas não percebi até já estar deitada, repassando os acontecimentos da noite,
quando aconteceu o impacto em cheio. O
pensamento conhece-te a ti mesmo
ficou voltando à minha mente, até que, em desespero, perguntei a mim mesma
seriamente, se eu realmente me conhecia.
Seria possível que eu estivesse enganada e que não fosse a enganada? Ouvi, pela primeira vez, essa tímida e pequena
dúvida, e então implorei a Deus que me ajudasse a conhecer o meu eu
verdadeiro. Com determinação, varri para
o lado os velhos argumentos e racionalizações e, admitindo a possibilidade de
que eu estava errada, disse: Seja feita a
Tua vontade, sem reservas. Com
incrível tranqüilidade e segurança, eu estava consciente da clareza de
pensamento a respeito de toda a situação, assim como de outros problemas
relacionados. Tudo simplesmente entrou
em seu lugar. As coisas impossíveis não
eram mais impossíveis. Compreendi
claramente que o que o meu marido havia sentido era a alegria natural de um pai
que tinha sido privado de ser verdadeiramente pai por muito tempo. O laço que eu tinha visto entre ele e a mãe
do jovem naquelas visitas, era apenas a preocupação que ele compartilhava com a
mãe do seu filho. Meus sentimentos em
relação a ela mudaram completamente desde então. Agora posso ser caridosa.
Acredito que o que recebi
foi uma verdadeira graça de Deus e que isso tornou possível para mim, voltar
com grande bem-estar à minha antiga religião e a fazer alguns ajustes difíceis
na minha vida. Acredito que, por meio do
Al-Anon, a maioria das pessoas é levada a uma verdadeira espiritualidade, de
forma suave e gradual, sem passar por medidas drásticas. Acredito, contudo, que eu estava tão longe e
tão desesperada pela ajuda de um Deus pessoal e misericordioso, que precisava
de uma espécie de terapia de choque para me mostrar o caminho. Sempre precisamos de ajuda de Deus, naturalmente,
mas algumas vezes precisamos de cirurgia divina para remover falhas insidiosas
que continuam a se alastrar e podem afetar todo o nosso ser. Se alguma coisa como esta me acontecer
novamente, espero conhecer o suficiente para fazer uso do Passo Sete* (Humildemente,
pedimos a Ele para remover nossas imperfeições) e
orar com muita humildade e fervor pela remoção das minhas imperfeições. Agora sei, sem sombra de dúvida, que nossas
falhas podem e serão removidas através de uma graça especial de Deus, e que
isso aconteceu por causa do Al-Anon.
Passos 1, 2, 3 e 4:
*Passos
5, 6, 7 e 8:
Passos 9, 10, 11 e 12: