DEPOIMENTO: A HISTÓRIA DE UMA MÃE


Sou mãe de uma alcoólica. Também sou ex-esposa de um alcoólico.  Eu me divorciei dele, mas mesmo que quisesse, não poderia me divorciar de minha filha.  E eu não queria isso.  Depois do primeiro choque ao saber que um de meus filhos era alcoólico, o que eu mais queria no mundo era fazê-la encontrar a sobriedade.  Mas não consegui.

Usei todas as velhas e inúteis técnicas tentadas por aqueles que têm um alcoólico na família.  Chorei, briguei, tentei convencê-la, tentei suborná-la, neguei-lhe favores.  Uma vez, cheguei mesmo a bater nela.  Finalmente eu própria cheguei ao fundo do poço.

Lembro-me daquele dia.  Não creio que ela estivesse mais embriagada do que habitualmente, mas percebi que eu não sabia mais o que fazer.  Deitei-me na cama chorando.  Aos poucos, uma lembrança começou a me incomodar.  Há alguns meses, eu tinha lido um artigo numa revista sobre um grupo de familiares de alcoólicos,  mas não conseguia me lembrar onde.  Já tinha ouvido falar de AA, e então telefonei.  A voz do outro lado era cordial e amistosa.  Ela percebeu que eu queria o Al-Anon e me encaminhou a uma senhora maravilhosa que me disse todas as coisas certas e me falou de uma reunião na tarde do dia seguinte.

Na reunião eu quase não falei nada.  Estava espantada com a alegria dos membros.  Uma companheira contou a simples história da sua vida com um alcoólico.  Outros fizeram comentários, compartilhando um pouco das suas próprias histórias à medida que falavam.

Quando o tempo se esgotou, todos insistiram comigo para qu eu voltasse na próxima semana.  Ninguém veio com conversas de ser firme e de não consentir que um filho se saísse com aquelas bobagens.  Disseram-me que minha filha estava doente, tão doente, como se ela estivesse com diabete, tuberculose ou qualquer outra doença.


Raramente eu perdia uma reunião.  Em pouco tempo estava tomando parte nas discussões.  Li tudo o que pude encontrar a respeito do alcoolismo e até decidi participar de uma reunião de AA.  Fiquei tão convencida de que AA era a resposta ao problema de minha filha que mal podia esperar para lhe contar.  Descobri que a sua reação foi a habitual.  Ficou ainda mais calada, me interrompeu e recusou-se a ouvir.
Depois de freqüentar as reuniões de Al-Anon por meses, finalmente aprendi que o programa ERA PARA MIM quer minha filha aceitasse AA ou não.  O seu objetivo era ME dar compreensão e tolerância, me ensinando a aceitar com tranqüilidade aquele peso tremendo.

Ir às reuniões abertas de AA também é bom para aqueles que não bebem.  Continuei ouvindo os alcoólicos contarem a mesma história: que só quando eles atingem o fundo do poço e não tem nenhum lugar para aonde ir, eles finalmente se voltam para Deus, para AA, para buscar uma Ajuda de qualquer tipo.  Comecei a pensar se eu não estava sendo uma muleta e falei sobre minhas dúvidas com o psiquiatra da minha filha, com alguns Aas, com membros do Al-Anon, e com os médicos que achavam que era inútil internar minha filha novamente.  Todos concordaram que a dependência dela com relação a mim era muito grande.  Então, tomei a importante decisão de cortar meu auxílio financeiro a ela.

Certa manhã, depois de uma das suas piores bebedeiras (tinham me dito que esta era a melhor hora para falar), desci as escadas para o seu apartamento e lhe falei da minha decisão.  Disse que sentia que tinha estado errada em assumir as responsabilidades dela e que dali por diante deixaria que ela mesma dirigisse a sua vida.



Ela ficou sentada cruzando e descruzando os dedos e, finalmente, perguntou: O que vou fazer? Como vou me arranjar? Você pode decidir por si mesma.  Respondi, rezando silenciosamente pela ajuda de ser firme.  Só quero que você saiba que eu a amo e que estou tão perto quanto o telefone.  Se você precisar de mim, tudo o que tem a fazer é me chamar.  Então a deixei.

Eu tinha instruído a telefonista e também uma sobrinha, para que a controlassem e me avisassem.  Como vêem, eu não tinha realmente me soltado e me entregado a Deus.  Mas depois da minha reunião de Al-Anon daquela semana vim para casa com uma grande sensação de alívio.  Acho que então eu realmente tinha me soltado e me entregado a Deus.

No dia seguinte dessa reunião, a telefonista me chamou para dizer que não tinha conseguido entrar em contato com minha filha.  Corri para baixo e encontrei jornais de dois dias empilhados diante de sua porta.  Ao som da minha chave, seu cachorrinho começou a latir freneticamente.  No mais, o local estava excessivamente silencioso.  Atravessei correndo a sala para o quarto dela e lá estava ela no chão com as mãos acima da cabeça, na posição em que costumava dormir quando era criança.  Ela não se mexeu e, quando a toquei, estava gelada.


Desde então se passaram três anos, mas ainda fico triste.  Em vão tenho tentado compreender que nem todos chegam ao AA, que ela provavelmente nunca teria conseguido, e que Deus simplesmente estendeu sua mão e a levou, que devo aceitar a Sua resposta as minhas orações, mesmo que essa resposta não tenha sido aquela que eu queria.

Percebi que me agarrei aos meus companheiros do Al-Anon porque somente eles poderiam compreender a minha dor.  Os preceitos do Al-Anon me ajudaram a aceitar aquilo que não posso modificar e estou começando a ter um pouco de serenidade. Foi muito difícil aceitar esta tragédia, mas acredito que não teria podido aceitá-la de maneira alguma, sem o programa do Al-Anon.

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